Italo Calvino | Palomar


"O senhor Palomar fez correr um olhar de pássaro. Procura pensar no mundo tal como é visto pelos voláteis; ao contrário dele, os pássaros têm o vazio que se abre sob eles, mas talvez nunca olhem para baixo, vêem só para os lados, planando obliquamente sobre as asas, e o olhar deles, tal como o seu, onde quer que se dirija, não encontra mais do que tectos, mais altos ou mais baixos, construções mais ou menos elevadas, mas tão densas que não lhes permitem descer muito. Que lá em baixo, encaixadas, existam ruas e praças, que o verdadeiro chão seja aquele que está ao nível do chão, é uma coisa que ele sabe com base noutras experiências: neste momento, a julgar por aquilo que vê cá de cima, não poderia suspeitá-lo.

Assim pensam os pássaros, ou pelo menos assim pensa o senhor Palomar. 'Só depois de ter conhecido a superfície das coisas - conclui - nos podemos aventurar a procurar o que está por baixo. Mas a superfície das coisas é inesgotável.'"

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